terça-feira, 6 de novembro de 2012

Resposta a um de meus leitores

Desculpe não haver retornado, antes, professor. Recebi sua primeira mensagem num momento em que tento me virar com  problemas sérios de doença na família. Obrigado pelo comentário sobre o artigo "A educação mala", no jornal "A Notícia" (19/10/2012, p. 32). É gratificante saber que o meu trabalho foi útil à sua atividade  pedagógica.

Quanto à educação, tenho uma experiência de 23 anos em escola regular (fundamental, médio e superior) e, anteriormente, atuei durante 5 anos como professor de teatro na Casa da Cultura de Joinville. Meu contato com as novas gerações foi sempre desafiante para mim mesmo e, ao mesmo tempo, me deu a oportunidade de contribuir com algumas pitadinhas de ética e de estética que, hoje, alguns de meus alunos agradecem.

Sua reflexão desencadeou outra em mim, que me fez inclusive pôr em dúvida este esforço enorme (da RBS) por dar à educação uma ênfase que começa a me parecer deformada: todos os aspectos da vida humana e social são importantes. A educação é apenas um deles e embora seja ótimo que a RBS queira (pelo menos explicitamente) contribuir para melhorá-la, ainda mais importante seria se ela buscasse tornar-se uma empresa de comunicação eticamente mais exemplar do que pareceu, por exemplo, durante a campanha política recente e depois.

De modo geral, acho que somos todos filhos do nosso tempo. Mais do que aos professores, é à sociedade como um todo – pais, escola, meios de comunicação, as artes, os esportes etc. – que se devem atribuir as causas dos comportamentos que caracterizam cada época. Também às religiões (e suas trocentas igrejas e seitas) cabe uma enorme responsabilidade na deformação das novas gerações. Elas têm, de modo geral, prestado um grande desserviço à humanidade em todos os cantos da Terra. Aqui no Ocidente, com o aparecimento do Cristianismo e lá no Oriente, com a disseminação vertiginosa do Islã, os seres humanos têm sido submetidos a enormes tribulações por causa de verdadeiras bobagens consolidadas como dogmas e normas, que têm dificultado o avanço da boa convivência social e tem massacrado o livre pensamento onde quer que ele ouse brotar. De modo geral, professor, nosso sistema de educação foi moldado pela igreja que causou a morte de perto de 500.000 mulheres durante a Idade Média e de mais de 10 milhões de nativos americanos ao botarem os pés aqui no continente. Só recentemente, aos pouquinhos, vimos nos livrando dessa herança maldita.

Por isso, gosto muito da irreverência que nossa geração assumiu como um modo de vida, lá pelos anos 1960/70. Apesar de todo o esforço do meio em que nasci em me educar na marra para ser um defensor da moralidade mosaica, meus pais conseguiram preservar uma certa leveza na maneira como nos educaram. Lembro bem dos meus 17-18 anos, filho mais velho de uma família de mais 10 irmãos e irmãs. Usávamos cabelos longos, íamos a festas com os amigos, queríamos romper com nossas famílias etc. Mas, acabamos todos perfeitamente integrados e vivendo em harmonia com nossos pais até os últimos momentos da vida deles. Eu não tenho filhos, mas meus irmãos e irmãs me deram 25 sobrinhos e, estes, mais uns 8 ou 10 (perdi a conta) sobrinhos-netos. São ótimos! Também fazem festas enoooormes, querem levar a vida na flauta... mas acabam trabalhando mais do que nós próprios  trabalhamos na juventude, e têm uma vida saudável sob todos os aspectos. 

Quando nos encontramos nos eventos familiares, fica claríssima uma coisa: trabalhar e brincar são as duas atividades mais importantes da vida, porque dão sentido à existência. A educação, me parece, deveria ser a ponte entre um e outro desses dois âmbitos da vida social... mas, obviamente, as forças produtivas querem apenas que a educação forme trabalhadores (mais precisamente, escravos). No passado, com a ajuda das igrejas, isto era mais fácil. Hoje, com a circulação copiosa das informações, já está mais difícil domar a liberdade quando brota nos espíritos mais jovens e independentes (por isso a necessidade da assessoria dos meios de comunicação!).

Penso que o futuro humano, professor, não será, daqui a 200 ou 500 anos, muito diferente do que é hoje e do que foi há 200 ou 500 anos. Os seres humanos são os mesmos dos últimos 200.000 anos e o que vai mudando é o estilo de vida que caracteriza cada momento da História. 

Obrigado por me haver induzido a estes pensamentos – um alívio em meio à vertigem dos consultórios, exames, diagnósticos, remédios e preocupações. Hora destas esta mensagem também vira um artigo ;)

Abraço.

Borges de Garuva.